Tarcísio quer mobilizar bancada contra centralização de impostos

Tarcísio quer mobilizar bancada contra centralização de impostos

Consultora diz que governadores teriam de esperar ‘mesada’ paulista caso não haja o Conselho Federativo Diretora de cursos na York University, em Toronto, é especialista em Imposto sobre Valor Agregado (IVA), base da reforma

Governador de SP rejeita ideia de criação do Conselho Federativo, que centralizará a arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços, tributo que vai unificar ICMS e ISS. Bancada paulista na Câmara tem 70 deputados.

Pelo texto em análise na Câmara, Conselho Federativo centralizará a arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços, que vai unificar o ICMS (estadual) e o ISS (municipal)

Governador do Estado mais rico do País, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo, firmou posição contra o chamado Conselho Federativo, um dos pilares do projeto de reforma tributária. Ele afirma que pretende mobilizar a bancada paulista na Câmara para tentar barrar a medida. São Paulo tem a maior número de deputados federais, com 70 membros, cujos interesses regionais se sobrepõem às diferenças partidárias sobre o tema.

A reforma tem como critério a “não cumulatividade plena”, ou seja, o imposto será pago uma vez e descontado nas etapas seguintes da produção. E será por meio do conselho que os créditos tributários acumulados serão pagos.

O comitê, formado por representantes de Estados e municípios, centralizaria a arrecadação do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que vai unificar ICMS (estadual) e ISS (municipal). A junção permitiria, segundo técnicos, que a compensação de créditos ocorra sem que um Estado fique devendo ao outro ou fique dependente do pagamento do outro.

Em evento em Lisboa, Tarcísio disse não aceitar “de maneira nenhuma” que o tributo pago dentro de São Paulo seja destinado ao comitê. Em reunião com governadores na residência oficial do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na semana passada, ele já havia indicado o temor de perder o controle da arrecadação em seu próprio território. Além de São Paulo, outros Estados como Rio, Goiás e Pará também são contra a centralização.

Tarcísio tem dito, porém, que não é contra a reforma e que concorda com outros parâmetros da proposta. Relator do texto na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), já foi informado que São Paulo pretende apresentar uma contraproposta até a próxima semana.

O secretário paulista da Fazenda, Samuel Kinoshita, defende a criação de uma câmara de compensação, pela qual os Estados compensariam uns aos outros ao fim do dia por operações que transbordam os limites de cada unidade da Federação.

Técnicos afirmam, porém, que a solução se complica quando se considera os mais de 5,5 mil municípios, que também farão parte da reforma e terão a gestão da arrecadação compartilhada no Conselho Federativo. •

Contraproposta

Governo paulista defende a criação de uma câmara de compensação para a repartição dos recursos

“No sistema que não seja o conselho, ele (Ronaldo Caiado, governador de Goiás) vai ficar dependendo de mesada de outros Estados, prioritariamente São Paulo”

Abrasileira Melina Rocha, consultora internacional na área tributária, alerta que os Estados poderão ficar dependentes de São Paulo caso aceitem a proposta do governo paulista de substituir na reforma tributária a criação do Conselho Federativo para gerenciar o novo imposto por uma câmara de compensação para o repasse dos recursos arrecadados.

A criação do conselho é um dos pontos mais polêmicos do parecer do relator da reforma, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Pela proposta, o comitê terá independência, gestão compartilhada e paritária entre Estados e municípios. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como antecipou o Estadão, lidera uma frente para barrar o modelo.

Para ela, o conselho dará mais autonomia aos Estados, diferentemente do que disse ao Estadão o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil) – que afirmou que não iria viver de “mesada” com a reforma. Segundo ela, sem o comitê, os governadores vão depender “de mesada de outros Estados, prioritariamente São Paulo”.

Durante governo Lula, em 2008, os Estados de São Paulo, Rio e Minas foram contrários à reforma. O que mudou agora?

Ela foi barrada depois da apresentação (do relatório) do deputado Sandro Mabel. O José Serra (governador de SP na época) usava o contexto da crise econômica de 2008, com medo de perda de arrecadação. Uma coisa muito interessante de ver é que a adoção do princípio do destino (tributação onde o bem ou serviço é consumido) sempre foi um critério que trouxe resistência. Agora, o que eu vejo é que, até o ano passado, tínhamos uma convergência por parte de todos os Estados.

A divergência maior é na criação do Conselho Federativo para gerir o IBS, o novo tributo que será criado com a reforma?

Alguns Estados estão dizendo que o conselho fere a autonomia, o que não é verdade.

O governador de SP, Tarcísio de Freitas, diz que é a favor da reforma, mas tem se colocado contra. As resistências dos governadores agora são maiores ou menores do que as do passado, quando a reforma foi barrada?

O Kinoshita (Samuel, secretário de Fazenda de São Paulo) já falou que não é contra o princípio de destino e só está contrário à forma de operacionalização, por meio desse Conselho Federativo. Ele vê o conselho com uma centralização que é desnecessária e apoia uma câmara de compensação entre os Estados para fazer essa intermediação das operações interestaduais. O problema todo é que temos os municípios nesse tributo e é impossível fazer uma câmara de compensação.

Como fica a pressão de São Paulo, o Estado mais rico?

Esse modelo (sem o Conselho Federativo) deixa São Paulo numa posição muito confortável, porque ele sempre vai receber. São Paulo fornece mais produtos para todos os demais Estados. Eles recebem mais produtos de São Paulo e iriam receber os repasses de São Paulo nesse esquema de câmara de compensação. São Paulo não ficaria dependendo do repasse de ninguém. Ele que teria repassar o dinheiro para o destino, porque os produtos prioritariamente saem de São Paulo, onde tem mais indústria. É muito conveniente defender esse tipo de proposta.

Poderia explicar melhor a razão dessa conveniência? São Paulo é o Estado produtor. Os produtos saem de lá e vão para os outros Estados. Ele que teria repassar o dinheiro da arrecadação. Os outros Estados ficariam dependentes de São Paulo.

São Paulo teria o maior poder nessa câmara de compensação?

Isso, com a proposta de São Paulo, que é não ter conselho.

Qual é a importância do conselho?

Ele evita que haja esse repasse de dinheiro entre os Estados e municípios, do produtor para o destino. O próprio conselho já vai fazer isso e vai garantir que o dinheiro arrecadado com o IBS no meio da cadeia produtiva já seja descontado como crédito, garantindo a não cumulatividade (sem tributação em cascata). Se a empresa acumular crédito, imediatamente vai ter o crédito devolvido. Sem esse conselho, como o professor Nelson Machado falou, vai acontecer o que acontece hoje no ICMS. O dinheiro entra para os cofres dos Estados e eles não devolvem (para o contribuinte). Eles criam uma série de empecilhos para não devolver crédito para o ICMS. Isso vai acontecer se não tiver um Conselho Federativo centralizado para fazer a administração da devolução de crédito.

O conselho asseguraria essa devolução?

O conselho é muito melhor para os Estados para garantir autonomia. São os próprios entes que vão fazer parte da gestão. É melhor do que ficar dependente de um Estado só, por exemplo. O Caiado falou: “Não quero ficar dependente de mesada”. Mas no sistema que não seja o conselho, ele vai ficar dependendo de mesada de outros Estados, prioritariamente São Paulo. Estão trocando uma coisa que é garantia para ficarem dependentes.

Dos Estados mais ricos produtores?

Isso, exatamente. •

FONTE: O Estado de SP – 26.07.2023

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