Quase metade das máquinas da indústria do País é obsoleta; veja os setores mais defasados

Quase metade das máquinas da indústria do País é obsoleta; veja os setores mais defasados

Estudo inédito da CNI mostra que idade média do maquinário industrial é de 14 anos; com a defasagem, setor aumenta gastos com manutenção e consumo de energia e perde competitividade

Boa parte da indústria brasileira opera com maquinário antigo e defasado tecnologicamente, o que resulta em menos competitividade e menos produtividade. A idade média de máquinas e equipamentos usadas nas indústrias de transformação e extrativa é de 14 anos e 38% usam equipamentos que estão próximos ou já ultrapassaram a idade sinalizada pelo fabricante como ciclo de vida ideal.

Em foco por causa da necessidade global de redução de emissões, o setor de biocombustíveis aparece na pesquisa como o de maior defasagem de equipamentos, com idade média de 20 anos, seguido por metalurgia (18 anos); impressão e gravação (17 anos); e veículos automotores, bebidas e químico (exceto higiene pessoal, perfumaria e cosméticos), com 16 anos (veja quadro abaixo).

O cenário já era de conhecimento de todo o setor industrial, mas agora foi confirmado em sondagem inédita feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Embora não haja dados anteriores para comparação, a gerente de Estratégia e Competitividade da CNI, Maria Carolina Marques, considera o índice de obsolescência muito elevado.

“Um parque industrial defasado significa menos produtividade porque as máquinas podem quebrar a qualquer momento e paralisar a produção, os custos de manutenção são maiores, assim como o consumo de eletricidade e de emissões de gases de efeito estufa”, afirma Maria Carolina.

Entre as empresas que responderam a pesquisa, apenas 2% têm máquinas com até 2,5 anos de uso. O maior porcentual, de 28%, tem equipamento com 10 a 15 anos e 32% com até 40 anos.

A principal proposta da CNI para estímulo ao investimento em renovação de maquinário é a depreciação acelerada. Hoje, o equipamento industrial é depreciado (perda de valor do ativo) ao longo de dez anos e os valores são descontados do Imposto de Renda da empresa.

Ontem, o ministro da FazendaFernando Haddad, disse que essa medida está prevista para 2024 e que o orçamento pode variar de R$ 3 bilhões a R$ 15 bilhões, dependendo do alcance da proposta e do que o Congresso aprovar. “Reafirmamos o compromisso com a tese da depreciação acelerada, mas ainda vamos definir o alcance dela, que pode variar em relação aos setores que vai abranger, em relação ao encurtamento do prazo”, disse.

Crédito customizado

Sobre o setor de biocombustível, o presidente da Be8, Erasmo Carlos Batiistella, confirma que, “de fato, não tem passado por atualização constante”. No caso do segmento de biodiesel, área de atuação da empresa, os grandes investimentos ocorreram entre 2005 e 2007. Segundo ele, o País não tem uma política clara de incentivo para a melhoria do parque industrial . “Temos feito esforço grande para manter nossos parques industriais atualizados, mas isso requer muitos recursos da companhia”, diz.

Criada há 18 anos, a Be8 tem fábricas no Rio Grande do Sul e no Paraná, além de Paraguai e Suíça. A idade média dos equipamentos da empresa é de 15 anos, mas Battistella ressalta que há muitas empresas do ramo operando com maquinário que ultrapassa 20 anos. Segundo ele, além da atualização, é preciso manter a inovação tecnológica dos parques, o que exige investimentos anuais.

“Por exemplo, falamos tanto de energia renovável, de transição energética e não há nenhum incentivo para a produção de energia limpa”, afirma o presidente da Be8 “Precisamos de linhas de crédito mais customizadas para esse tipo de indústria; um plano de financiamento e modernização como tem o Plano Safra, e também um tratamento tributário mais equalizado para concorrer com outras indústrias do mundo.”

Mesmo o fato de parte dos equipamentos estarem dentro do ciclo de vida estabelecido pelo fabricante não significa que a máquina é atualizada tecnologicamente. “A gente teve uma revolução tecnológica muito grande nos últimos anos com o advento das tecnologias da indústria 4.0 e tudo isso gerou um ganho de produtividade grande”, ressalta Maria Carolina, da CNI.

 

Ela explica que não havia nenhum dado sobre o tema, nem mesmo em países mais desenvolvidos. O resultado da sondagem especial, chamada de Idade e Ciclo de Vida das Máquinas e Equipamentos no Brasil, foi realizada em junho e divulgada pela CNI nesta terça-feira, 25. Foram entrevistados 1.682 executivos, sendo 672 de pequenas empresas, 599 de médias e 411 de grandes companhias. Também participaram 356 indústrias do setor da construção.

Para o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, a constatação da elevada idade média do maquinário da indústria brasileira não o espanta. “País fechado com forte estrutura de proteção industrial como o nosso não teria algo diferente”, avalia. Em sua opinião, o único caminho pra mudar esse cenário é uma combinação entre reforma tributária, maior abertura da economia com ampliação de acordos comerciais e investimento em educação com viés tecnológico.

“Dessas propostas, estamos avançando apenas na reforma tributária”, lamenta Vale. “Tirando as commodities, será difícil vermos uma integração maior com as cadeias globais de valor se não houver um pensamento diferente do que se fez por décadas. Políticas industriais como sempre se fez no País não funcionaram e o resultado é esse, um parque fabril antigo.”

Investimento em queda

No segmento de máquinas e equipamentos, a idade média é de 14 anos. Gino Paulucci Jr, presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), afirma que, atualmente, a alta taxa de juros trava e limita a capacidade de investimentos e afeta negativamente o crescimento do setor, que enfrenta um processo de desindustrialização.

Paulucci também informa que os investimentos em máquinas e equipamentos, que já tinham caído no ano passado, registraram queda de 6,5% no início de 2023. “Com o juro mais baixo, as empresas podem obter financiamentos a taxas mais atrativas, o que facilitaria a aquisição de equipamentos de última geração”, diz.

“Máquinas modernas oferecem maior eficiência energética, maior precisão, maior capacidade produtiva e melhores recursos tecnológicos, o que resulta em produtos de melhor qualidade, redução de custos e aumento da produtividade”, conclui Paulucci.

FONTE: O ESTADO DE SÃO PAULO – 26/07/2023