Guerra comercial: equívocos e efeitos sobre o Brasil

Guerra comercial: equívocos e efeitos sobre o Brasil

Claudio Adilson Gonçalez Economista e diretor-presidente da Vértice Macroeconomia, foi consultor do Banco Mundial, subsecretário do Tesouro Nacional e chefe da Assessoria Econômica do Ministério da Fazenda

Nos últimos dias, Donald Trump fez importantes recuos na guerra comercial que chegou a seu ponto máximo com o anúncio do tarifaço, em 2/4. Primeiro foi o adiamento por 90 dias das tarifas adicionais acima de 10% que aplicou para mais de 180 países, exceto China. E, mais importante, foi excepcionalizar, na noite de sexta-feira (11/4), das tarifas adicionais acima de 10% (inclusive dos 125% aplicados à China) produtos tais como smartphones, laptops, chips de memória, máquinas para fabricar semicondutores e televisores de tela plana.

O cenário internacional ainda é de muita incerteza, mas o recuo de Trump é bem-vindo. Sua obsessão pelo protecionismo se apoia em equívocos grosseiros.

O primeiro é que a causa do déficit em conta corrente (bens + serviços) dos EUA, que chegou a 3,1% do PIB, em 2024, e que Trump confunde com prejuízo, não decorre de mau comportamento dos parceiros comerciais, mas sim de a absorção interna dos norte-americanos (consumo + investimento) ser maior do que o PIB. Assim, sem reduzir essa absorção, o que é muito difícil econômica e politicamente, zerar esse déficit é impossível.

O segundo equívoco é desconhecer que os EUA não enfrentam qualquer problema para financiar seu déficit externo, uma vez que, ao menos enquanto preservarem a confiança em sua economia e em suas instituições, manterão o dólar como a

Economia brasileira tende a sofrer relativamente menos que outras mais integradas à cadeia global de produção

principal moeda de reserva global e de meio de troca nas transações internacionais.

O terceiro é não entender que a desindustrialização não impediu que a economia dos EUA prosperasse e se tornasse uma das mais produtivas do mundo. Empregos foram perdidos em alguns polos industriais, mas muitos outros foram criados em comércio e serviços sofisticados, principalmente em tecnologia da informação. A taxa de desemprego norte-americana é uma das mais baixas entre os países desenvolvidos.

Mas, como bem destacou o economista Samuel Pessôa, dessa política equivocada pode resultar um efeito colateral positivo: a China, em razão do baixíssimo investimento público em seguridade social, tem excesso de poupança e necessita muito do setor exportador para continuar crescendo. Com suas exportações dificultadas pela guerra tarifária, o governo chinês poderá ser forçado a estimular a absorção doméstica, o que reequilibraria sua economia. Isso seria positivo não apenas para a China.

Contudo, antes que isso ocorra, mesmo com o recuo parcial de Trump, o mundo passará por grandes dificuldades. Haverá queda de produtividade nas principais economias e, muito provavelmente, os EUA enfrentarão baixo crescimento (ou recessão) com pressões inflacionárias.

Este cenário de contração do comércio internacional afetará negativamente o Brasil. No entanto, por ser ainda relativamente fechada, o que reduziu seu crescimento, a economia brasileira tende a sofrer relativamente menos que outras mais integradas à cadeia global de produção.

FONTE: https://digital.estadao.com.br/o-estado-de-s-paulo/20250414/textview

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