A pressão dos salários

A pressão dos salários

Um mercado de trabalho robusto, com ganhos reais nos salários, tem sido apontado como uma dos motivos que têm segurado uma desaceleração mais rápida da inflação de serviços, ainda uma das maiores preocupações do Banco Central neste momento.

Mas há um debate entre analistas sobre quão apertado está realmente o mercado de trabalho e se os ganhos acima da inflação obtidos pelos trabalhadores nos últimos dissídios salariais vão resultar em um aquecimento da demanda, pressionando os preços de bens e serviços.

Segundo o Boletim Salariômetro,

da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), os trabalhadores conseguiram no mês passado o maior aumento para o mês de janeiro desde 2007, quando começou o registro das negociações coletivas. Foi, em média, um reajuste de 2% acima da inflação. Levando em conta todos os meses, esse ganho foi o maior desde dezembro de 2013. E a proporção dos reajustes acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) foi de 90,2%.

Hélio Zylberstajn, coordenador do Salariômetro, explica que o INPC muito baixo da data-base de janeiro, de 3,7%, abriu espaço para o reajuste surpreendente obtido pelos trabalhadores nas negociações salariais do mês passado. Já o IPCA (índice oficial da inflação) da data-base de janeiro foi bem mais alto, de 4,6%. Nessas negociações, é utilizado o INPC e não o IPCA. O INPC considera famílias que ganham até cinco salários mínimos, enquanto o IPCA engloba aquelas com renda até 40 salários mínimos.

“A inflação para a empresa foi de 4,6%”, diz Zylberstajn. Foi com base nessa inflação que os fornecedores dela reajustaram os preços, mas também a que serviu para a própria empresa remarcar os seus produtos. “A referência para o trabalhador foi de 3,7%, então a empresa conseguiu dar um reajuste maior”, diz.

É provável que o INPC siga mais baixo do que o IPCA também em fevereiro, refletindo uma alta menor dos preços de alimentos e itens básicos, que têm um peso maior na cesta de consumo das famílias que ganham até cinco salários mínimos.

Não obstante os ganhos reais dos salários resultarem de descompressão da inflação, não é possível dizer se esses reajustes reais vão manter a demanda superaquecida e fortalecer o mercado de trabalho. A taxa de desemprego fechou 2023 em 7,4%, o menor nível desde 2014. Há quem diga que a taxa de equilíbrio do desemprego que não gera inflação – caiu nos últimos anos. Já foi de 8% a 9%. Hoje, estaria entre 6% e 7%. Se isso for verdade, ainda há espaço para novas contratações e aumentos reais de salários.

Não é possível dizer se os reajustes reais vão manter a demanda aquecida e fortalecer o mercado de trabalho

FONTE: https://digital.estadao.com.br/o-estado-de-s-paulo/20240228/page/24/textview