O pato está triste porque não gosta de aumento de imposto

Empresário diz que retomará tom crítico à política econômica do governo Lula, aos juros altos e aos impostos.
Eleito ontem para presidir a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) a partir de janeiro de 2026, o empresário Paulo Skaf deixa claro, nesta entrevista exclusiva à Coluna do Estadão, que seu retorno ao comando da instituição – quatro anos após deixar o posto – significará a retomada do tom crítico em relação à política econômica do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, aos juros elevados e ao aumento de impostos.
Uma das marcas da gestão passada de Skaf foi o pato inflável amarelo, exposto na Avenida Paulista. O boneco virou sinônimo de críticas à alta carga tributária brasileira e, depois, também foi usado nas manifestações pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Atualmente, uma versão em miniatura de borracha ainda fica atrás de sua mesa no escritório, e Skaf brinca dizendo que “o pato está triste porque não gosta de aumento de imposto. Esse negócio do IOF não o deixou feliz, não”.
“Mais imposto é o que a sociedade brasileira não quer e não aceita mais. Então a Fiesp sempre teve uma postura muito forte contra o aumento de imposto e vai voltar a ter”, avisa.
O sr. é eleito num momento em que o Brasil está às vésperas de enfrentar o tarifaço do governo Trump. Qual deve ser o papel da
Fiesp neste momento? Nós temos uma certa urgência para essas providências do tarifaço. Então, eu espero, e vou fazer tudo como presidente eleito para que a Fiesp se envolva e ajude as empresas de todas as formas. A grande preocupação é que grande parte dos setores que estão taxados em 50% são predominantemente pequenas e médias empresas, que têm mais dificuldade.
O sr. pretende bater à porta do governo americano para tentar negociar, a exemplo do que fizeram alguns empresários, caso da Embraer?
Embora o meu mandato comece em 1.º de janeiro, eu vou estar à disposição dos setores produtivos. Mas, para o ano que vem, eu pretendo fazer um trabalho de forma permanente que vou chamar de diplomacia empresarial. Nós não podemos esperar as situações já críticas para correr atrás dos nossos parceiros e dos governos, como está acontecendo agora. Temos de nos isolar das tempestades políticas. A economia, os negócios não combinam com brigas e confusões. Negócios combinam com serenidade, com tranquilidade. Essa diplomacia empresarial vai significar um trabalho permanente. Empresas brasileiras, empresas americanas, a Fiesp (vai) ajudar esse entrosamento, identificando mercados, ajudando nos contatos com os dois governos. Nesse sentido, um dos nossos conselhos, que é o conselho de Relações Internacionais, eu farei esse conselho global e o presidente será o embaixador Roberto Azevedo, que foi presidente da OMC. E compondo esse conselho com as melhores cabeças, vamos ter um conselho que tenha visão global e faça com que a Fiesp pratique a diplomacia empresarial e ajude a não ter situações em que os setores produtivos possam ser afetados devido a questões que não têm nada a ver com a vida das empresas, do emprego, das relações dos países.
A Fiesp erra ou demora em procurar diretamente os EUA neste momento?
Neste momento eu não quero falar em nome da Fiesp. A Fiesp tem seu presidente, sua diretoria, e cabe a eles tomar as decisões, as iniciativas.
Como trabalhar com o presidente Lula para amenizar uma situação como essa do tarifaço, já que isso pede união de setor privado e governo, e a gente sabe que o senhor e o presidente Lula sempre foram adversários no campo político? Você sabe que, neste momento, eu não tenho nenhuma ligação política partidária. E assumindo a Fiesp a partir de 1.º de janeiro do ano que vem, naturalmente eu sempre vou respeitar os governantes que estiverem nos seus cargos. O presidente da Fiesp tem de ter um relacionamento com o presidente, governadores, ministros, prefeitos, deputados, senadores, independentemente de partidos e sempre visando o interesse do País. Na minha opinião, o governo brasileiro neste momento fez certas opções que não foram convenientes ao Brasil. Não sei por que o vice-presidente do Brasil (Geraldo Alckmin) esteve na posse do presidente do Irã. Também não entendi muito o presidente Lula estar na Praça Vermelha (em Moscou) por comemorações do Dia da Vitória. E depois de tudo isso, ainda numa reunião do Brics, o presidente do Lula discursa pela desdolarização. Todos esses gestos provocam o nosso principal cliente de manufaturas, que é os Estados Unidos. Os EUA são os maiores investidores no Brasil. Nós temos 27% do investimento estrangeiro no Brasil, alguma coisa em torno de U$ 300 bilhões, que são empresas brasileiras de capital americano. Então, eu creio que essas opções precisam ser revistas, porque a boa relação com a maior nação do mundo deve ser preservada e valorizada.
No caso do Brasil, Trump incluiu um fator político para impor tarifas. É uma forma de ultrapassar e afetar a soberania brasileira? Eu acho que o caso do discurso de desdolarização, depois daquela reunião do Brics, o Trump ameaçou taxar em 100% os países que participavam do Brics. Então, nós temos de enxergar isso com clareza e tomarmos essa cautela para essa situação se acalmar.
O que motivou o sr. a voltar à Fiesp?
Não era meu plano de vida, mas a vida tem planos para você. Houve uma iniciativa de praticamente todos os setores produtivos no ano passado. Fizeram assembleias, enfim, discutiram esse tema e teceram um abaixo-assinado convocando para participar e encabeçar a chapa das eleições deste ano. Eu achei esse movimento tão bacana e eu gosto muito do Brasil, e isso me fez aceitar a voltar a me candidatar. E eu penso poder ajudar bastante o Brasil a partir do ano que vem.
A indústria já representou 35% do PIB nacional hoje acho que roda em torno dos 11%.
A indústria de transformação 12%, mais a indústria de construção, que a Fiesp representa também, mais a indústria da mineração. Aí sobe esse número acima de 20% do PIB se você soma todas essas áreas. Mas já representou mais. Não tenha dúvida de que houve essa mutação no mundo inteiro. A indústria de transformação sente, e sente mais no Brasil porque a indústria, falando da indústria de transformação, tem normalmente ciclos longos. Quando você tem instabilidade, quando você tem juros altos, quando você tem o velho e sempre famoso custo Brasil, infelizmente. Os nossos concorrentes lá fora pagando juros baixos, não tendo essas dificuldades que nós temos aqui.
Esse tamanho hoje é o tamanho da indústria do Brasil, essa representatividade no PIB, ou ainda tem condições de voltar a patamares antigos?
Não podemos nos acomodar nesse tamanho, nós temos de aproveitar essa grande transformação. O que a gente precisa ter são as condições que os nossos concorrentes têm. Senão você vai pegar a indústria mais moderna que tenha no mundo, você instala ela no Brasil, ela perde competitividade, porque ela vai pagar juros alto. O imposto é alto, aí tem de ter escolta porque não tem segurança pública. Então nós precisamos consertar. Talvez o conjunto dessas coisas que me levaram a aceitar o desafio de voltar à Fiesp.
O pato volta também? Vejo trás do senhor a imagem do famoso pato da Fiesp.
Ele está lá porque é a história da Fiesp. Mas ele está lá, de vez em quando ele conversa comigo. O pato está meio triste porque ele não gosta de aumento de imposto. Esse negócio do IOF não o deixou feliz, não.
Mas a reforma tributária… A reforma tributária é um outro desafio que nós precisamos acompanhar. Ela tem pontos positivos, tem outros pontos que dependem de regulamentação que precisam ser acompanhados. Como, por exemplo, as alíquotas. Não estão definidas. É fundamental o acompanhamento e vamos fazer o acompanhamento desse Comitê Gestor. •
“Mais impostos é o que a sociedade brasileira não quer e não aceita mais. A Fiesp sempre teve uma postura muito forte contra aumento de imposto e vai voltar a ter”
“A reforma tributária é um outro desafio que nós precisamos acompanhar. Ela tem pontos positivos, tem outros pontos que dependem de regulamentação que precisam ser acompanhados”
FONTE: www.estadao.com.br