O ministro dos sindicatos

O ministro dos sindicatos

Marinho informa que o governo prepara projeto para ‘revisar pontos’ da reforma trabalhista, justo os que modernizaram as relações de trabalho e acabaram com a boquinha sindical

O governo Lula da Silva, na prática, não tem um ministro do Trabalho, mas uma espécie de “ministro dos sindicatos”. O histórico do sr. Luiz Marinho é conhecido. Mas, se ainda havia alguma dúvida sobre os reais interesses que ele representa no primeiro escalão da administração federal, uma recente entrevista concedida ao portal Jota serviu para escancarar que, entre a genuína defesa dos interesses dos trabalhadores e o resgate dos privilégios das guildas, o sr. Marinho não vacilará nem por um instante. Caso prosperem suas propostas, perderão os trabalhadores, em particular a esmagadora maioria não sindicalizada.

Entre barbaridades e distorções da realidade factual ditas sobre a atual legislação trabalhista, durante a entrevista o sr. Marinho ainda encontrou espaço para ameaçar o País com um rematado retrocesso. No Ministério do Trabalho, disse ele ao Jota, está em preparação um projeto de lei a ser apresentado ao Congresso com o objetivo de “revisar alguns pontos” da Lei 13.467/2017, a chamada reforma trabalhista. O marco legal, aprovado pelo Congresso durante o governo de Michel Temer, reformulou com absoluto sucesso a anacrônica Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O ministro do Trabalho, a bem da verdade, sabe que não tem a mínima força para propor e, menos ainda, ver prosperar um “revogaço” da reforma trabalhista, como manifestamente ele e outros petistas desejavam. Diante da realidade implacável, o sr. Marinho sinalizou, então, que se daria por satisfeito com as tais alterações pontuais. Seriam elas: a volta do chamado “imposto sindical”, ainda que dissimulado; o aumento das restrições para a terceirização de serviços, que o ministro comparou à escravidão, nada menos; e o fim do primado do negociado sobre o legislado, instituído pela Lei 13.467/2017, entre outras.

Ora, como se vê, por “pontuais” o sr. Marinho entende mudanças que feririam de morte a essência de uma reforma que, entre muitos acertos, trouxe uma legislação trabalhista que remontava à década de 1940 para a realidade laboral do século 21.

É próxima de zero a chance de aprovação pelo Congresso de um projeto de lei com o escopo de alterar uma reforma modernizadora como foi a trabalhista. Pouco importa, no entanto, que um projeto desse jaez jamais venha a ver a luz do dia. Mais preocupante é a sinalização de que há no seio do governo federal essa mentalidade orientada para o atraso, a sanha vã de destruir todo o bom arcabouço jurídico-normativo que foi implementado no País durante o tempo em que o PT esteve fora do poder central. A menos que o sr. Marinho seja desautorizado pelo presidente Lula da Silva, pode-se considerar que a intenção de revogar a reforma trabalhista tal como ela foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo ex-presidente Michel Temer é a posição oficial do governo federal.

“A reforma que o Temer fez é devastadora do ponto de vista de direitos”, afirmou o sr. Marinho, sem esconder que sua preocupação maior é dar sobrevida a um discurso político que foi superado pela transformação do mundo do trabalho e pela própria obsolescência de sua ideia de “direitos”. Não importa para o sr. Marinho que, no mundo dos fatos, com a promulgação da reforma trabalhista, se deu exatamente o oposto: uma massa de trabalhadores que não tinham seus direitos assegurados por lei passou a tê-los, como atesta um sem-número de evidências colhidas por instituições insuspeitas, como, por exemplo, o Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Portando-se menos como um ministro de Estado e mais como líder sindical, o sr. Marinho finge ignorar que a aprovação da reforma trabalhista pelo Congresso reflete, antes de tudo, um desejo da sociedade brasileira. Não foi Temer quem “fez” a reforma; o Executivo a propôs, o Legislativo a aprovou e, quando provocado, o Judiciário atestou sua constitucionalidade. Logo, o palavrório do ministro sindicalista, que fala em nome de Lula até prova em contrário, é só esperneio de quem tem saudade da legislação trabalhista que atravancava o País e ensejava a boquinha sindical.

Fonte: O Estado de São Paulo – 27/07/2023