Produtividade desafia a indústria
Estudo da FGV mostra queda de 23% da produtividade por hora trabalhada em 30 anos, sinal da dificuldade da manufatura nacional em acompanhar ritmo de evolução da indústria 5.0
Três décadas atrás, em 1995, o setor manufatureiro – conhecido como indústria de transformação, por converter matéria-prima em equipamentos e bens de consumo – registrava produtividade 78% acima da média geral da economia brasileira. Entre avanços e recuos, a distância encurtou e, no ano passado, o nível de produtividade da indústria de transformação estava apenas 9% superior ao resultado geral. Não seria uma notícia ruim, se indicasse uma melhoria profunda e geral da eficiência na produção brasileira, mas a realidade é que o parque fabril vem perdendo fôlego.
Levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), publicado pelo jornal Valor, compara o nível de produtividade de 1995 (R$ 58,8 por hora trabalhada) com o de 2024 (R$ 45,3) para concluir que essa relação despencou 23%. Não é uma regra geral na economia. Na agropecuária, que vem liderando investimentos em pesquisa e tecnologia, o valor de R$ 7,5 por hora trabalhada aumentou para R$ 40,6 entre 1995 e 2024.
O estudo foi feito em abril deste ano, mas dados desagregados e atualizados pela economista Silvia Matos, do FGV Ibre, mostram que a situação continua muito ruim, com desempenho satisfatório apenas no agro, que elevou a produtividade em 14,2% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. Foi o que garantiu o saldo positivo, ainda que insignificante, de 0,2% no total.
A fragilidade da indústria nacional com a perda de competitividade e produtividade tampouco é generalizada. Há exceções com tecnologia de ponta em linhas de produção, mas, na média, os dados mostram que o Brasil está ficando para trás. Diante dos dados recentes do IBGE, que mostram o rápido envelhecimento da população e o fim do bônus demográfico – quando a proporção de pessoas ativas na economia começa a perder espaço para os inativos –, o País precisa elevar de forma vigorosa a produtividade, assim como necessita de ajuste na Previdência e de investimento educacional em qualificação.
Com rapidez o mundo troca a recente “Indústria 4.0”, ou quarta revolução industrial, marcada pela integração de tecnologias digitais, pela moderníssima “Indústria 5.0”, focada na “humanização” da automação, que busca potencializar a criatividade humana tendo a seu serviço a tecnologia. Mas o Brasil ainda engatinha no uso de conceitos já amplamente disseminados como a internet das coisas, a inteligência artificial e a robótica avançada das chamadas “fábricas inteligentes” e está demorando a incorporar de forma ampla as tecnologias digitais.
Cabe, aqui, ressaltar que se trata de avanços que demandam investimentos pesados e consistentes, do tipo que precisa de um ambiente de negócios seguro para existir. Nenhum grande empreendedor privado se arrisca a alocar capital de bilhões num país desprovido de garantias regulatórias sólidas, segurança jurídica e situação econômico-fiscal minimamente previsível. Qualquer cenário duvidoso é suficiente para afastar o capital, e nesse quesito a economia brasileira tem dado margem a muitas dúvidas.
De outro lado, a cultura protecionista, continuamente cultivada, é mais um empecilho ao avanço tecnológico industrial. Políticas setoriais, com subvenções desnecessárias ou intervenção excessiva do Estado – que não são exclusividade do lulopetismo, mas aumentam sensivelmente em gestões do PT –, vão na contramão da competitividade.
Elevar a produtividade é produzir mais com menos, além de melhorar a qualidade dos produtos. Não é apenas uma forma de garantir mais competitividade às empresas, mas também de aumentar a renda per capita, de forma duradoura, pelos próximos anos.
Neste ano o Brasil perdeu duas posições no Índice Global de Inovação (IGI), ficando em 52.º lugar entre 139 países avaliados, de acordo com a classificação divulgada pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi) em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Deixou a liderança na América Latina, superado pelo Chile. É uma amostra de que a inovação é hoje um dos principais desafios para o País.
FONTE: O Estado de São Paulo – A3 – 04/12/2025
